Só nesta semana acessei esse clipe
lindo, “Vozes do Silêncio”, em que o Carlinhos Brown, em conjunto com o Centro
de Valorização da Vida (CVV), contribuiu
de maneira muito forte e bonita para as reflexões que foram realizadas sobre o
suicídio no mês do setembro amarelo.
Fiquei muito emocionado com o
vídeo, pensando nos vários silêncios que já vivenciei na minha vida e o quanto foi
importante poder encontrar espaço para falar dos mesmos. Vibrei muito com a força
com que a mensagem é passada e que esta tenha sido criada de uma forma em que
muitas pessoas possam ter acesso e possam ser encorajadas e ajudadas.
Porém, no meio de toda a minha empolgação,
me veio uma inquietação e por isso senti a necessidade de acrescentar uma
reflexão. Sinto que, devido ao fato do Brown ter feito o clipe em conjunto com
o CVV, o vídeo tem um sentido bem propositivo e oferece um direcionamento claro
para os silêncios das pessoas que estão nos seus inúmeros processos de sofrimentos,
com ideações suicidas, precisando falar e serem escutadas e acolhidas na sua
dor.
E qual é a minha inquietação? Falar
pode mudar tudo! Concordo plenamente.
No entanto, falar para quem?
Se estamos falando de suicídio,
endosso o convite do clipe para se falar com o CVV (https://www.cvv.org.br/). Já realizei um
trabalho em conjunto com voluntários da instituição no espaço em que atendo e
sinto que as pessoas podem encontrar um “lugar” muito importante para terem um
momento dessa escuta e acolhimento. Eles oferecem várias possibilidades gratuitas
de comunicação com os voluntários: desde chat na própria internet, e-mails, ligações
telefônicas através do 188, até encontros presenciais nos vários postos de
atendimentos em várias cidades do país.
Porém, senti falta no clipe de se ter um
olhar mais atento para essa pessoa que vai escutar quando alguém decide romper o seu silêncio.
Infelizmente, vivemos um momento social onde não são tantas pessoas assim que
estão disponíveis, receptivas ou sequer preparadas para ouvir outras pessoas
falando de sofrimentos e dores abissais. Não é raro chegar no consultório muitos
clientes que falam do quanto foram julgados ao falarem de depressão, sofrimento,
vontade de se matar, etc. Muitos podem receber como resposta várias frases e
posturas por parte dos seus ouvintes que têm o potencial de, além de não
produzir o alívio tão bem demonstrado no clipe, aumentar ainda mais a solidão,
o isolamento e toda a confusão mental e emocional que também é relatado no clipe.
“Isso é falta de Deus no coração!”;
“Tem gente com uma vida muito
pior que a sua e estão aí vivendo...”;
“Você deveria pensar na sua
família!”;
"Você é jovem. Tem muita coisa ainda pra viver!"
"Você é jovem. Tem muita coisa ainda pra viver!"
“Seja forte! Quem pensa nisso tem a mente
fraca”.
E tantas outras falas que eu
poderia reproduzir com efeitos tão devastadores quanto.
A partir destes relatos que penso
que é de extrema importância que possamos, tal como o clipe fez, mostrar que
existem possibilidades de ajuda para as pessoas que estão nos seus silêncios.
Contudo, podemos ir além, refletindo também sobre o quanto esses silêncios podem
ser um reflexo da dificuldade em se encontrar uma escuta mais disponível e
empática nos lares, escolas, universidades, grupos de amigos, ambientes de
trabalhos, igrejas, etc. Pois, a depender da reação de quem está escutando a
pessoa que fala sobre suicídio, falar pode realmente mudar tudo... mas não para
melhor.
Eu entendo que, talvez, a solução
não seja querer que todo mundo faça um curso de psicologia ou ainda o curso
preparatório gratuito que o CVV oferece para novos voluntários. Contudo, é
importante que possamos pensar sobre como estamos lidando com os nossos familiares,
pessoas próximas, amigos, colegas de trabalho, se perguntando o quanto estamos
sendo mais ou menos atentos e acolhedores para o sofrimento daqueles com quem nos
importamos.
Não quero dizer com tudo isso, de maneira simplista, que
a culpa ou responsabilidade de uma pessoa cometer o suicídio é de uma outra
pessoa que era da sua convivência e que não se importou com o que estava se
passando com ela. Mas podemos procurar informações, compreender um pouco mais
sobre as várias dimensões que podem estar envolvidas na questão do suicídio, bem
como também cuidar da nossa saúde mental. Desta forma – caso alguma situação dessa
esteja acontecendo perto de nós – possamos ser agentes que ajudam, de maneira
cuidadosa, para que as pessoas possam sair dos seus silêncios e encontrem saídas
para os seus dilemas, ao invés de reforçarmos ainda mais esse silêncio com nossas
posturas e julgamentos .
Ao ver o clipe uma dezena de
vezes por ter gostado muito dele, comecei a visualizar e gostar da ideia de
outro clipe complementar ao primeiro, onde a hashtag seria #saberescutarpodemudartudo.
Sinto que nessa condição de ser
possível romper o silêncio – mas também de ser escutado de maneira empática,
respeitosa e cuidadosa – podemos criar uma base mais sólida que ajude a
diminuir a incidência do suicídio na nossa sociedade.