quarta-feira, 7 de abril de 2021

Luz na escuridão - Depoimentos sobre a temática do Abuso Sexual

 




Estarei a partir deste momento compartilhando os depoimentos que tenho recebido das pessoas que tiveram algum contato com a temática das pessoas adultas que foram abusadas sexualmente através das atividades que venho desenvolvendo.

Separarei os depoimentos em marcadores daqui do blog para facilitar achar mais rapidamente o que se está procurando.

Os marcadores serão separados entre

1 - Pessoas adultas abusadas sexualmente na infância e adolescência (PASIA) e que tiveram algum benefício no seu processo pessoal;

2- Profissionais que sentiram que se aprofundar mais sobre a temática foi significativo para sua atuação profissional;

3 - Familiares ou pessoas próximas das PASIAs que sintam que puderam ter uma compreensão melhor sobre as várias dinâmicas que envolvem a temática do abuso sexual.

É importante ressaltar que trazer esses depoimentos não tem, de nenhuma forma, o objetivo de prometer que as pessoas que entrem em contato com a temática vão ter os mesmos resultados que serão mostrados aqui. Como sempre enfatizo nas minhas falas, a maneira como cada pessoa vivencia o abuso sexual pode ser muito particular, fazendo com que a saída dessa prisão também tenha tempos e ritmos; cores e dores; barulhos e silêncios; caminhos e paisagens; quedas e saltos; conquistas e derrotas; sombras e luzes muito diferentes para cada pessoa.

Compartilhar esses relatos tem muito mais o objetivo de materializar uma esperança de que é possível ver luz na escuridão. Ao abrirmos mais espaços de escuta, acolhimento e cuidado para essa temática, podemos lidar com essa lama que já está acumulada por tantas gerações e, talvez, construir uma sociedade onde não seja tão penoso lidar com essas feridas em silêncio.

Que possamos estar juntes nessa missão.

"Uma história sobre as memórias que nos assombram e a verdade que nos liberta...”

 

Essa frase do título está na capa do filme - O príncipe das Marés (1991)

Ao trabalhar com pessoas adultas que foram abusadas sexualmente na infância e adolescência poder surgir muito o questionamento sobre o quanto é importante olhar para o passado, muitas vezes sofrido, onde aconteceu o abuso sexual.

Para algumas pessoas olhar para esse passado parece uma perda de tempo, um vitimismo infantil e desnecessário, atitude de uma pessoa pessimista que fica se apegando às coisas ruins da vida ao invés de perceber que ela não é mais uma criança e que tem que olhar para a frente ao invés de ficar “ruminando” o passado. Afinal de contas “não vai mudar em nada” ficar olhando para o que aconteceu.

Essa postura de muitas pessoas que não passaram pela situação do abuso sexual e até de várias que também passaram só dificulta uma melhor compreensão do sofrimento pelo qual muitas pessoas estão aprisionadas durante anos.

Gosto muito da frase citada no início desse post e que foi retirada da capa do filme. Ela mostra o quanto pode ser uma empreitada frustrante e exaustiva não olhar para determinadas memórias que insistem em serem lembradas e que podem tomar a pessoa de assalto em momentos bem inesperados.

Tem uma cena do filme que para mim retrata um pouco dessa dinâmica. O Tom (personagem principal), depois de algumas sessões com a terapeuta e de começar a lembrar de muitas coisas do seu passado, vai passar um tempo na sua casa e participa de uma festinha de aniversário da sua filha caçula. Neste momento, onde a sua esposa está preparando o bolo com as suas filhas, ele começa a lembrar de um aniversário dele e da irmã dele e que teve uma cena de violência pesada entre os seus pais. Ele fica na lembrança durante um tempo e consegue ainda voltar há tempo de cantar o parabéns para a sua filha sorrindo

É importante destacar que o personagem se apresenta como uma pessoa muito distante emocionalmente de tudo, nunca se permitindo se conectar verdadeiramente com nada e com ninguém.

Aqui eu levanto uma hipótese teórica de que, quando temos feridas que ainda estão muito abertas dentro da gente, precisamos, de alguma forma, evitar entrar em contato com essas lembranças e, também, com eventos do presente que servem de gatilhos para acessarmos essas dores. Talvez o Tom nunca possa ter desfrutado de um aniversário da sua filha, porque não “conseguia” correr o risco de lembrar das violências que vivia na sua infância. Logo, se afastar de tudo funciona como um mecanismo de sobreviver a tantos choques traumáticos.

Porém, nesta cena, o processo acontece de tal forma que, ao ter um suporte de alguém que o ajudava a encarar esses porões obscuros do passado, o Tom, ao se lembrar do passado, não precisa ficar negando aquela experiência dolorosa que aconteceu. Ele pôde integrar que aquele evento faz parte da sua história e ainda tem tempo de se permitir ser afetado pelo que estava acontecendo no presente.

Então, olhar para o passado não é para ficar naquele passado, mas, sim para poder se libertar de tantas amarras que nos impedem de estar mais plenamente no presente. Quanto mais podemos ter um olhar cuidadoso para nossas dores passadas, mais podemos garantir elas não nos dominarão no momento presente. Quando mais olhamos para a verdade, mesmo que seja permeada por sofrimentos, mais é possível encontrar uma liberdade dentro da nossa história.

Tenho visto isso acontecer com muitos clientes e isso é muito gratificante!

Vamos olhar mais para o que precisa ser visto?