Abrindo um Preambulo.
Antes de tudo, eu gostaria de indicar
que, ao meu ver, esse post não se enquadra a toda e qualquer realidade social do
momento atual. Sinto que estarei falando do meu lugar na sociedade e dos
clientes que fazem psicoterapia comigo. Tenho clareza que é fato que, para um
número grande de pessoas em situações de maior vulnerabilidade social, muitas
coisas que estou falando aqui nessa postagem fazem pouco ou nenhum sentido. Tem
bons textos falando sobre essas diferenças que ficam ainda mais evidenciadas em
tempos de crise como agora. Lembro da frase que bem define isso:
Não, não estamos
todos no mesmo barco. Quando muito, estamos no mesmo mar, mas uns em iates e
outros agarrados a um tronco" (meme anônimo)
Mas ainda assim, gostaria de
compartilhar um pouco do que tenho pensado sobre coisas que uma parte da sociedade
está vivendo. Espero que contribua para que cuidemos mais uns dos outros,
incluindo aquelas pessoas que estejam vivendo algo diferente.
Fechando o preambulo.
Será que desaceleramos?
Neste período de pandemia
continuo realizando os atendimentos de psicoterapia com os meus clientes.
Porém, por reconhecer a importância do isolamento social, todos os atendimentos
estão sendo on line, para poder integrar a importância da continuidade do
cuidado com a saúde mental das pessoas e as orientações recomendadas pelos
órgãos que, de fato, estão comprometidos em cuidar com seriedade deste momento
que já está bem caótico.
Ao acompanhar os meus clientes, bem
como por também estar vivenciando essa “quarentena”, tenho visto como toda a
vida ficou meio confusa, sem um norte claro, sem que as pessoas saibam muito
bem como lidar com esse isolamento repentino. A dimensão do tempo ganhou uma
importância grande nesses últimos dias. O que estive, estou e estarei fazendo
com o meu tempo a partir de toda essa situação? Particularmente, não estou com meu
tempo mais livre. Ademais, parece que tenho menos tempo agora do que tinha
antes da pandemia.
Nesse sentido, uma reflexão me chamou
a atenção por esses dias que dizia respeito à oportunidade de desacelerarmos as
nossas vidas, juntamente com as nossas relações, para buscarmos nos entender um
pouco mais nessa loucura que se tornou a vida.
Ressignificar as relações com
tudo: vida, família, trabalho, saúde, consumo, meio ambiente, cuidados com a
casa, enfim, prioridades. Achei essa proposta muito importante, pensando no
quanto tenho recebido pessoas no meu consultório que sofrem com essa “normose”,
vivendo essa vida corrida, no modo automático, a partir de hábitos, costumes e
posturas altamente adoecedoras para si e para os outros, sem questionarem se o
que se considera normal atualmente é o melhor para a vida no planeta. Lembra a
frase que tem circulado (não consegui identificar ao certo a autoria):
"Não podemos voltar ao normal porque o normal era exatamente o problema. Precisamos voltar melhores. Menos egoístas. Mais solidários. Mais humanos".
Mas daí comecei a perceber o movimento
de muitos dos meus clientes, a partir de tantos incentivos feitos pela
internet, de quererem aproveitar tudo que eles podiam fazer na quarentena e que
não cabia na rotina do cotidiano. A partir do estímulo de aproveitar “o tempo
livre” para rever a sua vida, muitas pessoas resolveram: faxinar toda a sua
casa e/ou apartamento; fazer todos os exercícios físicos; ler todos os livros atrasados que se tinha em
casa – sem esquecer de ler também vários livros que foram disponibilizados e
socializados na quarentena; fazer todos os cursos gratuitos que apareceram; assistir
todas as lives que tantas pessoas estão fazendo – bem como todos os filmes e
seriados; desenvolver seus dotes culinários; criar uma rotina de jogos e
ocupações para as crianças, etc. Isso sem contar com as atividades diárias e
necessárias para se cuidar da casa e das crianças, sem a comum terceirização
que é feita em dias “normais”.

Logicamente que eu não estou
querendo dizer que cada coisas dessas não possa ser, em si, muito bom para que
possamos fazer algo de útil e proveitoso durante a quarentena. O que me
preocupa é a manutenção de um tipo de funcionamento que só muda de conteúdos,
mas que permanece com o mesmo imperativo de ter que correr tanto para dar conta
da vida novamente. Então não acho que o “problema” esteja na qualidade das
coisas estão sendo feitas, mas sim, na sobrecarga que se acumula e faz com que a
vida pareça ficar com muito mais autonomia e bem-estar, mas, que no fundo,
reproduz uma mesma lógica robotizada e desconectada se não se tiver cuidados. O
fato de termos que nos isolar não garante que a velocidade diminua. Muitas
pessoas aceleraram e muito dentro dos limites que a quarentena impõe.
Tenho suspeitado que se ocupar muito
neste momento também é uma forma de não entrar em contato com tantos sofrimentos,
medos, incertezas, inseguranças, etc. Não quero dizer que toda fuga tem que ser
considerada negativa. Acho que se todo mundo parar para pensar no que já está
acontecendo e no que ainda estar por vir, muitos não conseguiriam continuar
fazendo as coisas diárias que são necessárias para continuar tocando a vida em
tempos sombrios. Mas penso que, se a quarentena durar mais tempo do que gostaríamos,
esse modo de funcionamento, de evitar o contato com as nossas próprias emoções,
também trará suas consequências na saúde mental e emocional de todas as
pessoas.
Foi necessário se preocupar com
coisas muito práticas e concretas para lidar com esse início de pandemia. A
vida de muitos e muitas estavam e ainda estão correndo um sério risco. Esses
cuidados ainda precisam ser mantidos. Mas, com a continuidade da quarentena, precisamos
cuidar da nossa saúde mental para podermos passar por essa quarentena da melhor
forma possível. Vi alguns textos orientando as pessoas a fazerem coisas para
não se angustiarem nesse período ou para não ficarem entediadas durante a quarentena.
Mas a angústia faz parte desse processo. Ela tem que ser incluída para
repensarmos de verdade sobre tudo que está acontecendo nas várias dimensões da
vida. Eu desejo que possamos cuidar mais do nosso emocional, incluindo todas as
tensões que isso implica, ao invés de ter que seguir as receitas pré-fabricadas
de como ter uma quarentena top, com alta performance, ou super espiritualizada,
descontextualizando-se para não sofrer.
Muitos projetos foram criados para
dar suporte psicológico voluntário e gratuito durante esse tempo de pandemia.
Busquem esses cuidados, caso não tenham recursos ou não saibam a quem recorrer
nesse momento.
Para quem estiver com condições financeiras,
a psicoterapia on line também poder ser um recurso muito importante nestes
momentos. Não para lidar, somente, com os efeitos emocionais negativos dessa
pandemia, mas, sim, como um cuidado que pode se estender para além desse momento
mais emergencial.
Que possamos cuidar mais da nossa
saúde mental e emocional no meio de tudo isso que está acontecendo...
Se você estiver precisando de ajuda profissional, pode entrar em contato comigo através do meu whatsapp:
(81) 99840.8940