sábado, 9 de junho de 2018

Revelando-Ser - Convite no Facebook

Olá pessoas.
Postei esse texto no dia 05 de junho de 2018, chamando as pessoas para conhecer mais de perto esse projeto tão importante.
Vou deixar que a própria postagem "fale por si"...rsrs

.
Boa tarde, pessoas. Queria compartilhar com vocês uma parte do que venho fazendo profissionalmente há algum tempo e que tem ganho ainda mais espaço na minha vida recentemente.

Algumas pessoas já devem ter visto que compartilho eventos, postagens ou vídeos de uma página que eu eu sigo aqui no FB, Revelando-Ser. Este é um projeto que eu criei, juntamente com alguns amigos e profissionais, e que já vem sendo gestado há cerca de dois anos. O objetivo desse projeto é colaborar na descontrução do “muro do silêncio” que existe acerca de pessoas adultas que foram abusadas sexualmente na infância e adolescência e que carregam consigo alguma ferida desse passado.

Desde 2010 que eu trabalho diretamente com a temática do abuso sexual, seja em projetos sociais, ou atendendo no meu consultório particular. Nesses dois espaços profissionais comecei a entrar em contato com essa demanda das pessoas adultas e percebi que o abuso sexual era algo muito mais frequente do que eu imaginava e do que se falava na sociedade. Desde então, tive vontade de criar um projeto que pudesse atender a esse público especificamente. Não porque é o público mais importante a ser atendido ou trabalhado, mas, sim, porque percebi que existia uma lacuna, tanto nos discursos, visibilidade, pesquisas acadêmicas, etc. - quanto nas políticas públicas de atendimento a esse público.

Desde então venho estudando, discutindo, refletindo e atendendo a estas pessoas que, parece que por sincronia, começaram a me procurar. Eu nunca tinha parado para dizer que trabalho especificamente com este tema, para gerar uma demanda de pessoas que me procurassem direcionados por uma divulgação. As pessoas foram chegando em momentos diferentes e isso me fez conhecer ainda mais de perto esta realidade.

Uma realidade confusa, permeada por muitas contradições que não se excluem, que se misturam, compondo uma paisagem de luz e sombra de difícil compreensão caso o ouvinte tenha pressa para entender o que “de fato” aconteceu. Algumas das contradições que tenho acessado a partir da situação das pessoas adultas e o abuso sexual:
- Escuto tanto relatos de lembranças intrusivas que insistem em não ficar no passado, voltando em muitos momentos em que o que a pessoa mais deseja é estar em paz e seguir adiante; bem como escuto relatos de “apagões” durante anos da infância onde a pessoa não tem ideia do que aconteceu com ela, não conseguindo entender quais as marcas que ela carrega. Não é fácil saber diferenciar o que não se lembra por uma dificuldade resgatar na memória mesmo, do que não se é lembrado por ser muito difícil para a pessoa suportar.
- Ouço pessoas que ficaram com uma profunda dificuldade de se permitir ser tocadas sexualmente por outras pessoas; como também ouço pessoas que têm dificuldades de encontrar um limite sexual entre elas e as outras, parecendo ter uma “abertura” que acaba, em alguns casos e paradoxalmente, também produzindo uma dificuldade de ser tocada mais profundamente por outras pessoas;
- Vejo pessoas que se reconhecem no lugar de uma vítima e que se sentem profundamente magoadas com a pessoa que esteve no lugar do abusador (a) e que não conseguem olhar sequer no rosto deste (a), o culpando por tudo que deu errado na sua vida; como vejo também pessoas que introjetaram de maneira significativa que ELAS foram culpadas pelo seu abuso, tendo dificuldade, inclusive, de expressar algum sentimento de mágoa ou raiva daqueles que foram autores daquela situação;
- Vejo pessoas que passaram por situações que em alguns manuais descrevem como um abuso sexual potencialmente mais grave - seja por ter uma violência física e ameaças, ou por ser um por um familiar muito próximo, de muita confiança - e que dizem não se sentirem muito afetadas pelo abuso; como também escuto pessoas que tiveram abusos que poderiam ser descritos como “mais leves” e que ficaram altamente marcadas por aquela situação.

Não se tem como generalizar qual será a marca que uma pessoa vai levar consigo ao ter passado por um abuso sexual. Eu falo acima de situações que parecem ser opostas, mas é muito comum encontrar gradações dessas experiências numa mesma pessoa. É possível que algumas pessoas tenham se envolvido em situações sexuais na infância e adolescência e que isso não tenha que, necessariamente gerar um trauma na sua vida. Porém, tenho encontrado pessoas que até reconhecem que esses eventos marcaram e que ainda assim não conseguem falar abertamente sobre isso, que precisam de um tempo para poderem se sentir seguras de entrar nesses porões e ver sentimentos que podem ser muito desestabilizadores, quase que desestruturantes em termos de personalidade.

Já me perguntaram se eu realmente acho válido tocar nesses assuntos depois de tanto tempo do ocorrido, quando parece que, de alguma forma, as coisas já se acomodaram e que a “violência não está mais acontecendo”. Essa não é uma resposta simples. Não é simples dizer que a violência não está acontecendo ainda. Não é simples mensurar o quanto é sofrido o silêncio, o quanto algumas pessoas ficaram isoladas dentro da própria família. Também não é simples medir o quanto a pessoa teve que cindir com várias coisas dentro dela para guardar esta situação somente com ela. E reparem que não estou nem falando de outro dilema que surge em muitas situações onde a pessoa começa a mexer nesses conteúdos: “Devo contar para as pessoas?”. “Vivo sem poder dizer o porquê que eu sempre fui uma pessoa agressiva, depressiva, ou desconectada da minha realidade. Porque, se eu for falar, eu toco num segredo que sei que ninguém quer desenterrar”. Isso também não é simples.

Porém, começar a mexer nisso também traz desafios.. Não é um convite que se resume em “vamos começar a falar sobre isso e você vai ver que tudo se resolverá e rapidamente você estará em paz”. Muitas vezes o que acontece é a pessoa passar por um deserto, onde muitas vezes ela tem vontade de desistir - inclusive algumas já interromperam o processo e não voltaram mais, outras pararam e depois retomaram em seguida - e que eu, enquanto terapeuta, ofereço suporte, confiança no processo, força, e companhia para esses momentos difíceis. Poderia falar muitas coisas desses processos. Fica pra uma próxima.

Apesar de eu observar que algumas mudanças referentes a esta temática acontecem de maneiras mais graduais, com o tempo, tenho sentido e acompanhado com muita alegria processos onde as pessoas estão conseguindo lidar melhor com as suas vidas, com os seus desejos, com os seus passados, e consequentemente com os seus futuros. São essas experiências que têm me dado uma motivação maior de estar encabeçando esse projeto. Apesar de todo cuidado e delicadeza que o tema requer, tenho acreditado que temos que falar mais sobre isso. Sincronicamente tem aparecido cada vez mais casos de pessoas adultas que foram abusadas sexualmente na infância e adolescência nas redes sociais, reportagens, reforçando ainda mais essa intenção que nutrimos há dois anos.


Queria, por fim, convidar vocês a conhecerem um pouco mais do nosso projeto, apresentar o nosso site: revelandoser.org . Para que possamos falar mais sobre isso, quem sabe indicar para pessoas que possam se beneficiar, pessoas que passaram por essa situação, ou profissionais que queiram saber um pouco mais do que estamos estudando, refletindo, produzindo por aqui. Estamos fazendo, pelo menos um encontro mensal para falar do projeto e aprofundar alguns temas relacionados ao nosso objetivo principal. Em breve estaremos oferecendo materiais em formas de encontros com uma maior carga horária e específicos para aprofundar temas que os encontros mais breves não dão conta. Ainda estamos ajeitando algumas coisas, mas, cada passo que a gente vai dando, motiva a gente para fazer ainda mais.
Edit: podem compartilhar à vontade está postagem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário